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O Cinema Argentino

Resolvemos aproveitar as férias da Lorys em Buenos Aires e fazer uma semana para lá de especial sobre o Cinema Argentino! Por aqui, vamos dar um panorama geral da História do Cinema Argentino, falar de seus diretores mais expressivos, de suas participações no Oscar e vamos até nos aventurar no mérito do Cinema Argentino ser melhor - ou não - que o Cinema Brasileiro. Lá no instagram (@atelaquehabito, segue lá), daremos dicas de filmes e diretores e mostraremos muita coisa relacionada ao cinema em Buenos Aires, em uma série de vídeos. Não deixe de acompanhar! Preparado? Bora lá então!



BREVE HISTÓRIA DO CINEMA NA ARGENTINA


O Cinema chega à Argentina pouco tempo depois de sua invenção e primeira exibição, na França (1895). No dia 18 de julho de 1896, no Teatro Odeón, é realizada a primeira exibição cinematográfica em solo argentino, com o cinematógrafo dos Irmãos Lumière e seus curta-metragens. Depois disso, não demora muito para que os argentinos comecem sua própria produção cinematográfica. As primeiras obras argentinas começam a surgir em 1897, registrando cenas do dia a dia (como nos curtas dos Irmãos Lumière), mas também registrando temáticas históricas e patriotas. Tanto que “La Bandera Argentina”, o primeiro curta-metragem realizado no país em 1897, por Eugene Py, registrava justamente a bandeira Argentina sendo hasteada.


Teatro Odeón (demolido na década de 1990) e Eugene Py

A partir de 1901 as cenas cotidianas passam a ser filmadas com cada vez menos frequência, dando espaço para filmes que contavam histórias (ainda que curtas). As temáticas históricas e patriotas continuam sendo exploradas por diversos realizadores, destacando-se Mario Gallo, que produziu uma série de filmes nessas linhas, sendo o primeiro deles “El Fusilamiento de Dorrego”, em 1908 e, em 22 de maio de 1909, estréia “La Revolución de Mayo”, no Teatro Ateneo.


Em 1914 é lançado Amalia, de Enrique García Velloso, o primeiro longa-metragem argentino, inspirado na obra homônima de José Mármol. As adaptações da literatura nacional acabam se tornando também bastante recorrentes no Cinema Argentino. Outro marco importante na História do Cinema, não apenas Argentino, mas geral, é a realização, em 1917 por Quirino Cristiani (um cartunista italiano que havia se mudado recentemente para a Argentina), do filme “El Apóstol”, que teria sido o primeiro longa-metragem de animação do Cinema. O filme foi feito como uma crítica ao então presidente da Argentina, Hipólito Yrigoyen, mas acabou destruído em um incêndio e o que sobrou dele foi sua história, reportagens da época sobre sua exibição e a arte conceitual dos personagens. As técnicas utilizadas foram animação de silhuetas e stop motion.


Cena de Amalia (1914) - Quirino Cristiani e alguns personagens de El Apóstol (1917)

Até então, o cinema na Argentina era feito de modo experimental, sendo encarado muitas vezes como entretenimento e show de variedades, apesar de já começar a demonstrar características próprias ainda nesses seus primeiros anos. Mas, em 1931, o Cinema Sonoro chega ao país, dando espaço para que enfim uma indústria cinematográfica seja estabelecida, já que a indústria fonográfica, as rádios e o teatro de revistas eram sucessos absolutos nessa época. Assim, o Cinema Sonoro conseguiu atingir enfim o grande público, algo que o Cinema Mudo não havia tido tanto êxito. O primeiro filme argentino, com áudio e vozes sincronizados, foi “Muñequitas Porteñas”, de José A. Ferreyra. Nessa época, a indústria cinematográfica no país se desenvolveu e cresceu, produzindo extensa filmografia, com comédias mais leves e dramas, voltados principalmente para o público feminino. Mas, a partir de 1942, com a Segunda Guerra Mundial, o cinema na Argentina passa a enfrentar muitas dificuldades: a importação de matéria prima é suspensa pelos EUA nessa época (retaliação pela Argentina ter se mantido em posição neutra no embate), o que acaba motivando a intervenção do Estado no financiamento e distribuição de filmes virgens para as produções. Com o fim da guerra e a eleição de Perón, o Cinema Argentino ganha novo fôlego com a Lei de Cinema (1946), mas é logo interrompido novamente em 1955, com a ditadura (Revolução Libertadora), tendo suas produções totalmente paralisadas por 2 anos, além das perseguições à pessoas ligadas à indústria cinematográfica.



Após 1957 o Cinema Argentino retoma suas atividades e, com novos diretores e novas ideias, passa a se renovar a partir da década de 1960, garantindo participações em festivais internacionais. No final da década de 1960, começam a aparecer o cinema alternativo, experimental e independente, conduzido por diretores vindos da publicidade e uma retomada do cinema político, de denúncias sociais, temas já presentes desde o início da cinematografia do país, mas que ganharam novas forças com a ditadura.


O país volta a ser uma democracia em 1973 e o Cinema Argentino volta a ser impulsionado, tendo tanto sucesso de crítica quanto de público. Com o fim da ditadura há também o fim da censura, promovendo espaço para uma espécie de “renascimento” do cinema nacional. Os filmes argentinos começam a participar - e ganhar - prêmios internacionais, passando a serem conhecidos (e reconhecidos) também fora da América Latina.


Cena de Rapado (1992)

A partir da década de 1990 surge o Novo Cinema Argentino, movimento marcado pelo caráter independente de suas produções, sendo seu precursor o filme Rapado (1992), de Martín Rejtman. Outros diretores independentes ganham espaço com filmes cada vez mais aclamados, principalmente pela crítica, valendo a pena destacar Lucrecia Martel, considerada uma das principais cineastas argentinas. A partir dessa época também, o Estado começa a tomar uma série de medidas protecionistas para a exibição dos filmes nacionais, garantindo que eles permaneçam mais tempo nas salas de cinema, além de outras medidas para financiamento e realização desses filmes, aumentando assim, razoavelmente, a produção cinematográfica no país. A partir dos anos 2000, em um novo movimento chamado de Buena Onda, os cineastas argentinos passam a contar histórias focadas no ser humano, com temáticas universais, usando sempre como pano de fundo seu contexto histórico, atingindo assim um público não apenas nacional, mas de qualquer lugar que possa se identificar com questões similares. Desde então, o Cinema Argentino tem se destacado cada vez mais e se estabelecido com produções relevantes. Ao longo de todos esses anos, são mais de 2500 filmes argentinos, sendo que em alguns anos o país conseguiu estrear mais de 60 títulos.


Lucrecia Martel nas filmagens de Zama (2017)

CINEMA ARGENTINO NO OSCAR


A partir da década de 1970, com o final da ditadura, o Cinema Argentino ganha novas forças e começa a participar de festivais internacionais. A Argentina é o único país latino-americano a receber dois Oscars de Melhor Filme Estrangeiro, tendo concorrido ao prêmio sete vezes, sendo assim, também, o país latino-americano com mais indicações nessa categoria.


1974 - A Trégua (La Tregua), de Sergio Renán

1984 - Camila, de Maria Luisa Bemberg

La Tregua (1974) - Camila (1984)

1985 - A História Oficial (La Historia Oficial), de Luís Puenzo - vencedor


1998 - Tango (Tango, No Me Dejes Nunca), de Carlos Saura

2001 - O Filho da Noiva (El Hijo De La Novia), de Juan José Campanella

Tango, No Me Dejes Nunca (1998) - El Hijo De La Novia (2001)

2009 - O Segredo dos Seus Olhos (El Secreto De Sus Ojos), de Juan José Campanella - vencedor


2014 - Relatos Selvagens (Relatos salvajes), de Damián Szifrón

Elenco de Relatos Salvajes (2014)

Além disso, a Argentina ganhou outros quatro Oscars em outras categorias:


1995 - Eugenio Zanetti vence o Oscar de Melhor Desenho de Produção por O Outro Lado da Nobreza (Restoration).

2006 - Gustavo Santaolalla vence o Oscar de Melhor Trilha Sonora por Brokeback Mountain.

2007 - Gustavo Santaolalla, pelo segundo ano consecutivo, vence o Oscar de Melhor Trilha Sonora por Babel.

2015 - Armando Bó e Nicolás Giacobone vencem o Oscar de Melhor Roteiro Original por Birdman.


Eugenio Zanetti - Gustavo Santaolalla - Armando Bó - Nicolás Giacobone


O CINEMA ARGENTINO É MELHOR QUE O CINEMA BRASILEIRO


Invariavelmente, ouvimos essa máxima por ai, que o Cinema Argentino é melhor que o Cinema Brasileiro. Não vamos entrar no mérito - e na polêmica - se de fato o é ou não, até porque são diversos fatores a serem considerados, muitos inclusive subjetivos, o que acabaria em um grande esforço com resultados nem tão garantidos assim. Mas vamos levantar algumas questões que podem explicar o porquê dessa impressão de superioridade do Cinema Argentino.


Um dos fatores de sucesso do Cinema Argentino são seus enredos e roteiros. Um dos fatores de sucesso do Cinema Argentino são seus enredos e roteiros. Isso pode ser atribuído à educação, no geral, dos argentinos e de sua politização, presente em sua vida diária, desde a época da escola, faculdade e além. Os movimentos estudantis e seus líderes tem muito peso, ainda nos dias de hoje, fazendo com o que o país tenha tradição e discussão política muito forte. Cerca de 80% dos argentinos que se formam no 2º grau entram na faculdade em até 5 anos depois da conclusão do ensino médio (não existe vestibular, apenas um curso de nivelação para cursos que demandam habilidades específicas). Os argentinos lêem mais e também escrevem mais, publicando mais livros que os brasileiros.


Outro fator relevante é a relação dos argentinos com a psicanálise. Existe um número expressivo de psicanalistas x habitantes no país. Mas, o que esse tipo de dado tem a ver com o Cinema? Ora, o Cinema, por muitas vezes, pode ser interpretado como uma forma de psicanálise, uma vez que, para quem assiste a um filme, sempre há a possibilidade de identificação e reconhecimento. Um filme sempre pode nos fazer refletir sobre nossas emoções ou nosso lugar no mundo, por exemplo. Enxergar pontos de vista desconhecidos, enfim! Inúmeros universos a serem explorados. Além disso, existe também o realizador como artista, expressando um ponto de vista particular, lidando com conflitos e com suas próprias emoções, através de imagens em movimento e sons.


A Argentina possui particularidades demográficas que também acabam por fazer diferenças substanciais em sua produção cinematográfica. Embora tenha a economia 5 vezes menor que a brasileira e seja um país 3 vezes menor que o Brasil, a Argentina tem cerca de 40% da sua população concentrada na área da Grande Buenos Aires. À título de comparação, São Paulo, por exemplo, concentra 15% da população brasileira. A diferença é bastante expressiva. Além disso, a Argentina forma anualmente em suas faculdades um número muito maior de profissionais de Cinema que o Brasil. Assim, com o maior número de profissionais, disponíveis em uma mesma área, maior a capacidade de produção. E a Argentina produz mais filmes que o Brasil. E, quando produzimos algo em quantidade, a qualidade pode ser alcançada com mais facilidade. Há mais margem para erros e, consequentemente, para mais acertos. Outro fato que distingue a produção cinematográfica nos dois países e intensifica suas diferenças são as medidas intervencionistas do governo argentino para impulsionar as produções nacionais e também para mantê-las por mais tempo nas salas de cinema do país, o que acaba, obviamente, favorecendo e incentivando uma produção cada vez maior de filmes nacionais.


Nada do que dissemos aqui atesta, de fato, a qualidade superior - ou não - do Cinema Argentino, mas mostra um pouco como os dois países tem características e particularidades que favorecem suas indústrias cinematográficas. Caso queira saber mais dados e mais informações, recomendamos a leitura do artigo “Cine Argentino - por que ele é bom… será?”, de Claudio Nazareno, publicado em 2017 e disponível aqui!


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