Pegamos carona no mais novo filme de Guillermo Del Toro, uma versão do clássico Pinocchio, para falar um pouquinho mais sobre essa extraordinária técnica de animação, o stop motion! Bora lá?
“A animação se tornou, na mente do consumidor, um gênero. Mas também é uma forma de arte. E, de todas as obras de arte dentro da animação, a mais sagrada e mágica para mim é o stop motion, porque representa o elo entre o animador e o modelo. Normalmente, o filme captura a realidade. A animação cria e precisa simular a captura. Você dá vida a ela, e essa é a forma de arte mais elevada.” Guillermo Del Toro no documentário Pinóquio Por Guillermo Del Toro: Cinema Feito à Mão (Guillermo del Toro's Pinocchio: Handcarved Cinema, 2022). Lembrando que já tivemos essa discussão aqui antes, sobre Animação NÃO ser um gênero cinematográfico (para ler clique aqui e para ouvir clique aqui).
Guillhermo Del Toro e seu Pinocchio
Stop motion - traduzido ao pé da letra como “movimento parado” - é uma técnica de animação que consiste em fotografar, quadro-a-quadro, objetos em diferentes posições para que, ao juntar todas essas fotos/quadros, ter-se a ilusão de movimento desses objetos. São necessários cerca de 24 quadros para termos 1 segundo de imagem em movimento. Daí, dá para imaginar quantos quadros, de pequenos movimentos, precisamos para ter uma animação em stop motion de 2 horas! Uma loucura! (a gente fez a conta pra vc: cerca de 172.800 quadros) Na pós produção são acrescentados os diálogos, trilha sonora e efeitos visuais.
Bastidores de A Noiva-Cadáver
A história do stop motion se confunde com a história do próprio Cinema: a técnica é utilizada desde os primórdios da 7ª arte, sendo difícil precisar qual foi o primeiro filme a utilizar o stop motion. Mas muitos atribuem sua invenção ao cineasta Georges Méliès (já falamos dele aqui, em nosso primeiro episódio sobre os primórdios do Cinema e também em outros momentos. para ouvir, cliquei aqui), que fazia bastante uso do stop motion (e de diversas outras técnicas e efeitos), inclusive em seu mais conhecido filme, Viagem à Lua, de 1902.
Hoje em dia, quando falamos em stop motion, muita gente pensa logo em animações, principalmente de massinha. Mas a verdade é que a técnica surgiu nos filmes de live action, para a realização/produção de efeitos especiais, como foi no próprio Viagem à Lua de Méliès. Ao longo dos anos as técnicas de stop motion foram se aprimorando e hoje em dia são usadas tanto na produção de efeitos especiais em filmes de live action quanto na produção de filmes 100% animados.
Viagem à Lua, de Georges Méliès
Um dos primeiros grandes nomes do stop motion foi o norte-americano Willis O’Brien (1886 - 1962). O’Brien é responsável pelo stop motion - utilizado como efeito visual - de filmes como O Mundo Perdido (The Lost World, 1925), o primeiro a apresentar dinossauros animados. O’Brien também foi responsável pelos efeitos visuais - mais uma vez utilizando o stop motion - de King Kong (1933), que até hoje impressiona pelo seu realismo (de acordo com as tecnologias disponíveis na época).
Willis O'Brien nos sets de King Kong e O Mundo Perdido
E, foi assistindo aos filmes de O’Brien, que outro grande nome da animação em stop motion surgiu: Ray Harryhausen (1920 - 2013). Após assistir King Kong, com apenas 13 anos, Harryhausen ficou absolutamente fascinado e obcecado com a técnica e passou a estudar tudo que ele julgava ser útil para a criação de efeitos especiais: desenho, teatro, pintura, escultura, cenários etc. Construiu um “estúdio” na garagem de casa e dedicou-se com afinco à manipulação quadro-a-quadro, produzindo diversos curtas. Tamanha dedicação foi logo recompensada: Harryhausen acabou trabalhanso profissionalmente no Cinema com efeitos especiais. Inclusive teve a oportunidade de trabalhar com seu grande ídolo, O’Brien, e toda a equipe original de King Kong em Monstro de Um Mundo Perdido (Mighty Joe Young, 1949), que inclusive levou o Oscar de Melhores Efeitos Especiais.
Ray Harryhausen e alguns de seus personagens
Ray Harryhausen foi responsável pelos efeitos visuais de filmes como Invasão de Discos Voadores (1956), Simbad e a Princesa (1958), As Viagens de Gulliver (1960), Jasão e o Velo de Ouro (1963) e Fúria de Titãs (1981), seu último filme e que traz, de certa forma, um pouco de tudo que ele criou e desenvolveu ao longo de sua carreira.
É importante pontuar que o trabalho de um animador de stop motion não se limita a “apenas” animar os objetos! Muitas vezes ajudam na criação do roteiro, na elaboração dos storyboards, construção dos cenários e até na direção dos atores! Isso quando os próprios não atuam, para uma melhor percepção da reação ou do movimento dos personagens animados!
Ray Harryhausen nos stes de A Fúria de Titâs e Jasão e o Velo de Ouro
Ah! E por falar em objetos ou personagens animados, também é possível fazer stop motion filmando atores quadro-a-quadro. Essa “variação” do stop motion é conhecida como pixillation e não é tão utilizada, mas o cineasta Nornam McLaren já levou o Oscar de Melhor Curta Documentário por Vizinhos (Neighbours, 1952), utilizando essa técnica.
Durante muito tempo o stop motion foi utilizado em filmes de live action, como recurso para a produção de efeitos visuais. Até porque, filmes feitos exclusivamente com essa técnica, demoram bastante tempo para serem produzidos e é a partir da década de 1990 que começamos a ver algumas produções de longas em stop motion, como O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas, 1993), tornando-se mais “popular” na década de 2000 com A Fuga das Galinhas (Chicken Run, 2000), A Noiva-Cadáver (Corpse Bride, 2005), Wallace & Gromit: A Batalhe dos Vegetais (Wallace & Gromit: The Curse of the Were-Rabbit, 2005), que ganhou o Oscar de Melhor Animação, dentre outros. Alguns desses filmes demoraram mais de 10 anos para ficarem prontos!
Wallace & Gromit: A Batalha dos Vegetais
Atualmente, o Laika Entertainment, LLC., nos EUA, é o maior estúdio de animações em stop motion. Criado em 2005, tem como filme de estréia Coraline e o Mundo Secreto (Coraline, 2009), baseado na obra homônima de Neil Gaiman. Assim como Coraline, os demais filmes do Laika: ParaNorman (2012), Os Boxtrolls (The Boxtrolls, 2014), Kubo e as Cordas Mágicas (Kubo and the Two Strings, 2016) e Link Perdido (Missing Link, 2019), concorreram ao Oscar de Melhor Filme de Animação, mas infelizmente nenhum chegou a ganhar.
Bastidores de Kubo e as Cordas Mágicas
Outros filmes em stop motion para assistir. Obs: TODOS concorreram ao Oscar de Melhor Filme de Animação, mas nenhuma animação em stop motion chegou a ganhar, só Wallace & Gromit mesmo. Quem sabe Pinocchio muda essa história ai?
O Fantástico Sr. Raposo (Fantastic Mr. Fox, 2009), de Wes Anderson
Mary e Max: Uma Amizade Diferente (Mary and Max, 2009), de Adam Elliot
Frankenweenie (2012), de Tim Burton
Anomalisa (2015), de Charlie Kaufman
Minha Vida de Abobrinha (Ma vie de Courgette, 2016), de Claude Barras
Ilha dos Cachorros (Isle of Dogs, 2018), de Wes Anderson